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Gol e ace contra o machismo


Assim como semana passada dois acontecimentos mostraram que o futebol vai muito além das quatro linhas, esta semana duas atitudes reafirmaram a importância da mulher no esporte e do esporte feminino. Terça-feira a Federação Holandesa de Futebol (KNVB) divulgou o novo escudo da seleção feminina. O leão, que antes era o símbolo tanto da equipe masculina quanto da feminina, foi trocado por uma leoa, numa atitude tão óbvia que impressiona o fato de não ter sido considerada antes. No dia seguinte, após ser eliminado em Wimbledon, o tenista Andy Murray corrigiu um jornalista que perguntava sobre Sam Querrey, seu algoz, ser o primeiro tenista norte-americano numa semifinal de Grand Slam desde 2009, desconsiderando os feitos de cinco tenistas mulheres durante esse ínterim.

"Tenista homem", disse Murray - há que se considerar que a palavra usada na pergunta original foi "player", que em inglês significa "jogador" (de tênis), sem distinção de gênero. Desde 2009, a norte-americana Serena Williams conquistou 13 títulos de Grand Slams, além de três vice-campeonatos e de disputar outras três semifinais. Só no Aberto da Austrália deste ano, três das quatro vagas nas semifinais foram ocupadas por americanas: Serena, Venus Williams e Coco Vandeweghe. Madison Keys (2015) e Sloane Stephens (2013) também alcançaram as semifinais do Aberto da Austrália recentemente, além de Venus Williams ter participado de outras quatro semifinais de Grand Slams desde 2009 - e duas finais, perdendo os títulos para a irmã. A pergunta do repórter, sem distinção de gênero, mas considerando apenas o masculino, pode até ter sido feita sem intenção de explicitar seu machismo, mas certamente ele não faria o mesmo erro no sentido inverso: perguntar sobre um feito de uma jogadora sem usar o adjetivo "female" antes de "player".

Murray já havia passado por situação similar após conquistar o bicampeonato olímpico no Rio ano passado, quando um repórter da BBC, ao entrevistá-lo, disse que ele era a primeira pessoa - usando um substantivo que necessariamente engloba ambos os gêneros - na história a ganhar duas medalhas de ouro olímpicas no tênis. Na ocasião, o britânico disse que Serena e Venus tinham ganho umas quatro medalhas cada - Venus tem ainda uma de prata.

O tênis é um dos esportes mais populares e rentáveis do mundo, com prêmios de até 3,5 milhões de dólares por um título, fora patrocínios. No entanto, as chaves femininas ainda distribuem, muitas vezes, valores menores que as masculinas e são preteridas nas programações dos torneios, evidenciando o machismo que há no esporte como um todo. Atitudes como a do ex-número 1 Nojak Djokovic, que declarou recentemente que os tenistas homens deveriam sim ganhar mais do que as tenistas mulheres porque suas partidas têm mais espectadores, só contribuem para aumentar esse machismo. Nesse ambiente, as atitudes de um jogador - homem - de destaque como Murray são mais do que louváveis: são necessárias. Murray é também apenas o segundo caso de um tenista masculino no top 10 do ranking a ter sido treinado por uma mulher (o russo Andrei Chesnokov, que chegou a ser número 9 do ranking em 1991, teve Tatiana Naumko como sua treinadora por 14 anos).

No futebol, onde o machismo é ainda mais evidente, a seleção feminina da Holanda vai estrear seu novo escudo, com uma leoa, na Eurocopa deste ano. Por causa do leão que é símbolo da KNVB, a equipe nacional já era chamada de "as leoas". A mudança no escudo procura, portanto, não só diferenciar - e destacar - a seleção feminina, mas lhe dar a sua própria identidade, estampando o apelido no uniforme - a seleção masculina já tem sua identidade, consolidada a partir dos anos 1970 e simbolizada no apelido "Oranje" (Laranja).

A mudança, idealizada por uma agência de publicidade, Wieden+Kennedy Amsterdam, juntamente com a KNVB e a Nike, fornecedora de material esportiva da equipe holandesa, e foi divulgada por meio de uma campanha da fabricante americana. "Eles nos chamam de leoas. Porque nós jogamos com fome. Somos selvagens em nossos corações e indomáveis em nossas habilidades. Agora vestimos o que somos" diz o material promocional. "É uma ideia que perdurará e uma declaração forte que vai ajudar a continuar acelerando o momento de crescimento em torno do futebol feminino. É uma mensagem que dá às jogadores femininas algo delas mesmas em torno do qual se reunirem", declarou Hannah Smit, diretora de arte da agência.

Mais do que isso, é uma mensagem que reitera que lugar de mulher é no futebol sim. É no tênis. É no esporte. É onde ela quiser.

Crédito: divulgação Wieden+Kennedy Amsterdam Nike KNVB

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